Luiz da Rosa, Diretor de Comunicação do Instituto dos Irmãos Maristas; Mestre em Exegese pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma; criador do site www.abiblia.org
Durante muito tempo a Bíblia ficou longe do povo, especialmente no contexto católico. A Reforma, há cerca de 500 anos, usou a Bíblia como um instrumento para o ‘combate’: os protestantes acreditavam que dar a Bíblia ao povo era a solução para restaurar a autêntica vida cristã. Nasceram assim muitas traduções da Bíblia, em ambiente protestante, como a Almeida, em português. A contrarreforma, promovida pela igreja católica, acentuou outro comportamento: preservou a Bíblia do ‘consumo’ popular e a isolou, colocando-a quase exclusivamente no púlpito. Como consequência as Escrituras ficaram bastante inacessíveis à maioria dos católicos. Essa situação começou a mudar somente há algumas décadas, certamente graças à promoção do estudo e do uso da Bíblia por parte das comunidades protestantes e, mais tarde, pelas igrejas evangélicas.
Junto com a sede pela Palavra de Deus, detectamos infelizmente um aumento da leitura fundamentalista. Esse é o risco que corre quem se aproxima das Escrituras sem uma mediação, sem instrumentos adequados. Os livros da Bíblia foram escritos há muito tempo e não é fácil para nós entendermos todas as suas lógicas. A mentalidade, a língua, a geografia e os símbolos usados por ela são tomados de uma realidade profundamente diferente da nossa.
Paralelo a isso, podemos recordar que a difusão das ciências levou muitos a questionarem as narrações bíblicas, colocando em xeque a sua verdade. Contrapondo essa crítica, outros defendem, com unhas e dentes, a exatidão de quanto está escrito na Bíblia. Há muitos que não conseguem admitir que cabe às ciências explicarem como se deu a evolução da espécie humana e não à narração do Gênesis. Tudo na Bíblia é verdadeiro, como afirma o magistério. Mas podemos também dizer, sem medo, que nem tudo o que está escrito na Bíblia, conforme o nosso ponto de vista de crônica da história, é exato. Essa afirmação não compromete em nada a autoridade das Escrituras, mas apenas revela a sua natureza, que não é a de ser uma crônica ou um livro científico, mas de transmitir o sentido que o autor inspirado descobriu nos eventos que marcaram a vida da humanidade, em geral, e do povo de Israel, em particular. Essas verdades transmitidas não são meras descobertas humanas, mas aquilo que Deus mesmo quis transmitir. É evidente a necessidade da presença de um mediador.
É óbvio que fazer exegese, em sentido lato, está ao alcance de todos, pois basta abrir a Bíblia e tentar compreendê-la para entrar nessa dinâmica. Esse é o primeiro estágio, mas uma fé verdadeira busca entender e não se contenta com o passo dado. Para ir além, é necessário estudo, é necessária uma metodologia que pode ser adquirida de muitas maneiras. Além do estudo acadêmico clássico, o mundo digital oferece inúmeras ferramentas. O site abiblia.org, que criamos há 20 anos, pode ser considerado um desses instrumentos. Ele responde a perguntas dos leitores, de maneira muito simples, mas com uma preocupação científica.
Há também muitas atividades formativas organizadas por comunidades. Por exemplo, em 26 de agosto estaremos juntos em uma iniciativa promovido pelos mosteiros camaldolenses brasileiros da Transfiguração e da Encarnação, em parceria com a Faculdade de Filosofia e Teologia Paulo VI, da Diocese de Mogi das Cruzes e o Núcleo Fé e Cultura da arquidiocese de São Paulo. Vamos passar o dia conversando sobre a Bíblia.