Marcelo Musa Cavallari é escritor, tradutor e jornalista especializado em assuntos internacionais. Traduziu “O Livro da Vida de Santa Teresa D’Ávila”, para a Companhia das Letras e escreveu “Catolicismo”, para a Editora Bella. .
Dessa forma, é possível alguém ser católico e acreditar firmemente que sua alternativa é a melhor ou mesmo a única correta, evitando, assim, o relativismo denunciado pelo papa Bento XVI. Ainda assim, esse católico poderá estar na condição de achar que a sua é a única alternativa correta, mas é uma alternativa, isto é, algo intrinsecamente humano, medido, portanto, pelos mesmos critérios que as demais dimensões da vida humana. Uma vida plena seria aquela vivida numa sociedade justa e honesta, mantida por um trabalho útil, bem-remunerado e satisfatório, com saúde e equilíbrio em todos os papeis a que se é chamado, com a crença em Deus coroando tudo isso. Ter-se-á perdido de vista, nessa situação, quanto dista da vida neste mundo, por mais perfeita que ela seja, aquilo que a confiança em Deus acarreta. Essa secularização da alternativa cristã tornou opaca a transcendência, única aposta que importa. É quase inadmissível, para um tipo de catolicismo que vai se tornando cada vez mais dominante, a fala de São Paulo, para quem “o viver é Cristo e o morrer é lucro”, escrita há quase dois mil anos em sua epístola aos Filipenses, a ideia ainda ecoava nos versos de Santa Teresa de Ávila, no início da Idade Moderna: “Vivo sem viver em mim/e tão alta vida espero/que morro porque não morro.”
Publicação original: Jornal O São Paulo, edição 3183, 24 a 30 de janeiro de 2018
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Imagem: Montagem a partir do Cristo de São João da Cruz, de Salvador Dali.